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Mulher agachada de frente para um tiú
Foto: Suziane Fonseca

BH em Cantos: Mimos e cuidados

criado em - atualizado em

Fundação Zoo-Botânica

O Jardim Zoológico da Fundação Zoo-Botânica de Belo Horizonte desenvolve um trabalho especializado que é referência no Brasil e tem possibilitado muitos benefícios para a saúde física e psicológica dos mais de três mil animais de cerca de 250 espécies da instituição, entre aves, répteis, mamíferos e peixes. Esses benefícios são alcançados por meio de técnicas conhecidas como Enriquecimento Ambiental e Condicionamento Operante com Reforço Positivo, que fazem parte do Programa de Bem-Estar Animal da FZB-BH, implantado no Jardim Zoológico da FZB-BH no final da década de 90. 

Segundo a bióloga Cynthia Fernandes Cipreste, responsável pela área de Bem-Estar Animal do Zoo da FZB-BH, garantir que os animais experimentem altos níveis de bem-estar é uma preocupação constante de instituições que mantêm, em todo o mundo, animais silvestres sob cuidados humanos. 

“A exibição de maior diversidade comportamental, bem como a capacidade de se adaptar a situações estressantes, são bons indicativos de elevado nível de bem-estar animal. É importante estar atento a vários aspectos como as características comportamentais e o habitat de cada espécie, e também os hábitos e o histórico de cada indivíduo”, explica. 
 

Trabalhando na Fundação desde 2000, Cynthia inicialmente começou a desenvolver atividades de enriquecimento ambiental com acompanhamento comportamental dos animais tendo como base artigos científicos e livros sobre o assunto, além de aproveitar conhecimentos teóricos e práticos dos tratadores de animais e dos outros técnicos da instituição. 

Desde que área de Bem-Estar Animal foi criada, paralelamente às atividades de Enriquecimento Ambiental são realizadas também atividades de treinamento com a aplicação da técnica de condicionamento operante. Durante esse tempo, passaram pelo treinamento o gorila Idi, os rinocerontes, os grandes felinos, os hipopótamos, as girafas, as zebras, os avestruzes e os elefantes. Desse modo, a bióloga foi uma das principais responsáveis pela implantação dessas técnicas na instituição e constantemente tem promovido várias palestras e cursos sobre o assunto.

A bióloga Érika Fernandes Cipreste também faz parte da equipe de Bem-Estar Animal da Fundação Zoo-Botânica. Ela começou a realizar um trabalho voluntário de Enriquecimento Ambiental com uma jaguatirica em 2005. No ano seguinte passou a integrar oficialmente a equipe, que conta ainda com dois tratadores e uma estagiária.

“O que buscamos é sempre o melhor nível de bem-estar para cada animal. No caso do Enriquecimento Ambiental o objetivo é tornar o ambiente mais rico, mais atraente e para isso é preciso muito conhecimento de cada espécie e também do indivíduo. Tudo depende das características do animal e dos hábitos dele. Precisamos recriar o ambiente dele no Zoológico”, explica ela.

 

Trilha de Cheiros

O Enriquecimento Ambiental, como o próprio nome já indica, é uma técnica que foi desenvolvida para tornar o ambiente mais rico, mais próximo do que os animais encontrariam se estivessem na natureza. Para isso, são utilizados inúmeros estímulos (gustativos, olfativos, visuais, táteis) que tornam os recintos mais atraentes, mais apropriados para que esses animais tenham oportunidade de escolha e controlem seu ambiente por meio de interações com seu recinto, respondendo aos diversos estímulos com que se deparam e, assim, exibam maior diversidade comportamental. A equipe de Bem-Estar da FZB-BH segue uma programação semanal que estabelece o tipo de enriquecimento e o grupo de animais que irá recebê-lo. 

Isso significa que com o Enriquecimento Ambiental é possível simular situações encontradas na natureza por meio da inserção de estímulos no ambiente em que o animal se encontra. Os estímulos inseridos devem ser compatíveis com o comportamento de cada espécie e devem também atender às particularidades de cada indivíduo, levando em consideração as diferentes idades e problemas de saúde que podem ocorrer dentro de um grupo.

Desse modo, o recinto das araras, por exemplo, pode receber pingentes com frutas coloridas, ou uma “floresta”, ou ainda trouxinhas de folha de bananeira com sementes e grãos apetitosos. Outra forma de desafiar os animais é a colocação de uma trilha de cheiros (feita com temperos e outras especiarias), que estimula o olfato de felinos para que eles encontrem um embrulho com carne, ou caixas de papelão que guardam um pedaço de frango. Outro exemplo é o dos elefantes, primatas, psitacídeos e os carnívoros que, em algumas ocasiões, podem ser estimulados com um picolé feito com suco de frutas variadas e saborosas ou feitos de carne.

Essa técnica não deve ser confundida com a alimentação rotineira dos animais. É uma forma de oferecer um “quê a mais” para que mamíferos, aves, répteis e peixes possam sair da rotina e se interessar por outros elementos. Vale ressaltar que a criação de um ambiente mais estimulante, com desafios e novidades, simulando condições naturais que proporcionam maior qualidade de vida para as diferentes espécies é o principal objetivo do Enriquecimento Ambiental.

 

Galhos, cordas etc.

O tratador Justiniano das Graças de Oliveira também faz parte dessa equipe. Trabalhando no Jardim Zoológico há 30 anos, sendo 10 deles na área de Bem-Estar Animal, “Justino”, como é conhecido, faz uso da criatividade para criar elementos que tornam o ambiente dos animais mais diversificado. 
 

Com um olhar apurado, que vê em uma folha de palmeira caída no chão um ótimo material para fixação de pedaços de frutas, Justino é daqueles que a todo o momento está ocupado recolhendo galhos, tecendo mangueiras, preparando “guloseimas” com frutas, sementes e selecionando outros itens que irão atrair a atenção dos animais, como cordas, barbantes, caixas de papelão, pedaços de bambu etc. “O que me agrada é fazer as coisas e ver o resultado. Fico satisfeito com isso.”

No Jardim Zoológico há 39 anos, Silvania Lúcia Sorrentino da Cruz é uma das tratadoras de animais que foi incorporada à equipe de Bem-Estar Animal. Ela conta que, depois de trabalhar por muito tempo com as aves, queria ter mais conhecimento sobre outras espécies. “Meu trabalho tem sido muito bom. Muito gratificante, pois é bom ver que os animais estão interagindo com os elementos. Isso ajuda aqueles que têm um comportamento mais estressado”, diz.

 

Relação de confiança

O Condicionamento Operante com Reforço Positivo é também uma técnica utilizada para garantir um nível de bem-estar positivo aos animais sob cuidados humanos. Os animais são treinados para colaborar em procedimentos veterinários e em seu manejo, garantindo não só a redução dos níveis de estresse, mas também a segurança do próprio animal e dos técnicos e tratadores envolvidos no procedimento. 

Durante o treinamento, o animal aprende a cooperar mudando de posição ou apresentando partes específicas do corpo, ou ainda permanecendo em determinados locais para entrar em caixas de transporte, por exemplo. Com isso, o animal recebe algo prazeroso (geralmente alimentos), ou seja, a técnica possibilita uma relação de confiança entre treinador e animal e entre o animal e os responsáveis pelo seu manejo. Com isso, situações de estresse são reduzidas, pois é possível, por exemplo, a aplicação de um medicamento por meio de uma injeção ao invés do uso de uma zarabatana. 

De acordo com Cynthia Cipreste, o animal aprende que se cooperar receberá algo “bom” em troca, mesmo quando a situação for dolorosa, como durante a aplicação de uma injeção. A utilização do condicionamento operante contribui para aumentar os níveis de bem-estar dos animais, além de possibilitar que alguns tratamentos veterinários sejam realizados sem a necessidade de uma contenção química ou física. 

A bióloga relata um caso exemplar. “Pelo fato de ser diabético, o chimpanzé Serafim, precisa tomar insulina injetável e ter sua glicose medida todos os dias. Durante o treinamento Serafim apresenta partes do corpo como, braços, antebraços, perna ou costas para a aplicação da insulina todos os dias pela manhã. Além disso, o chimpanzé apresenta um dos dedos dos pés ou das mãos, para perfuração com uma agulha para a medição do seu nível de glicose, e, em troca, recebe uma porção de castanhas. Nada disso seria possível se Serafim não fosse treinado com a Técnica de Condicionamento Operante com Reforço Positivo”, explica.