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Oito mulheres produzem artesanato no Centro Cultural Jardim Guanabara. Atividade faz parte do projeto Troca de Saberes, que promove reuniões diárias com produção de artesanato e troca de experiências.
Foto: Cristiene Carvalho

BH em Pauta: Projeto Troca de Saberes democratiza artesanato

criado em - atualizado em
Quem frequenta ou vai pela primeira vez ao Centro Cultural Jardim Guanabara, na região Norte de Belo Horizonte, encontra várias atividades de diferentes linguagens. No entanto, uma chama atenção de imediato, pois em todas as tardes, de segunda à sexta-feira, um grupo de mulheres se reúne. É o projeto “Encontro de Troca de Saberes em Artesanato”, no qual essas mulheres não só criam peças como também compartilham técnicas sobre o fazer cultural.


Segundo a arte-educadora Cristiene Carvalho, o projeto surgiu a partir de uma oficina da área de patrimônio da Escola Livre de Artes, programa de formação da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), por meio da Fundação Municipal de Cultura (FMC). Ministrada pela arte-educadora Júlia Lage, a oficina conseguiu conscientizar as participantes sobre a importância de aprender e ensinar o artesanato a partir das interações e trocas cotidianas. “O trabalho envolveu as participantes de forma intensa. Muitas chegavam ao centro cultural antes do horário e iam praticar as técnicas aprendidas em dias que não tinham aulas”, relembra Cristiene.


Com a finalização da oficina, muitas participantes deram depoimentos sobre a importância destes encontros para a qualidade de vida e aprendizado do grupo. Com isso, a gerente do centro cultural, Marisa Gonçalves, propôs a elas que continuassem a frequentar o espaço para construir as obras de artesanato. “No início, algumas ficaram inseguras de produzir peças sem a supervisão de um professor da área de artes visuais ou de patrimônio. No entanto, com o passar dos encontros, elas perceberam que as trocas de saberes entre o grupo possibilitavam que todas ensinassem e aprendessem”, enfatiza Carvalho.


Esse foi o embrião do projeto Troca de Saberes, iniciado em maio do ano passado, depois da finalização da oficina. Espaço democrático e generoso para a prática e o compartilhamento, segundo a arte-educadora, a perspectiva de aprendizado a partir das relações entre as pessoas possibilita que os sujeitos sejam protagonistas no processo de produção artística.


A faixa etária das participantes varia entre 55 e 70 anos, ainda que o projeto esteja aberto para as interessadas a partir de 18 anos. Novos participantes podem se integrar ao grupo à medida que conhecem o projeto e são convidados a se reunir. Atualmente, os encontros contam com moradoras não só do bairro Guanabara, mas também do Floramar e do Jardim Felicidade.


Cristine Carvalho destaca a diversidade do resultado. “Como o grupo se caracteriza pelo aprendizado a partir da troca de saberes. Várias técnicas já foram trabalhadas, entre elas mandalas, patchwork, fuxico, pintura em tecido, crochê, bordado e aplicações”. Por estar abrigado dentro de um centro cultural, o grupo se recicla participando de outras atividades que trazem novos resultados para o trabalho. “Além dessas técnicas, essas mulheres já participaram de outras oficinas oferecidas que tratavam de temáticas como plasticidades populares, relações de gênero na sociedade e estamparia africana.”


Vilma Guilherme Magalhães, de 58 anos, aposentada e artista, moradora do Jardim Guanabara, ressalta a mudança na vida dela depois de frequentar o Troca de Saberes. “Antes eu ficava em casa assistindo sessão da tarde em uma solidão danada. Aí, quando começou a aula de bordado, nós engrenamos no crochê. Para mim representou muita coisa, sair de casa, pois tenho um compromisso todas as tardes, ter a companhia das meninas e o divertimento”. Vilma ressalta ainda não só o aprendizado como o efeito dele na saúde. “Eu mal sabia fazer correntinha de crochê. Hoje eu já faço mantas para sofá, tapete, flores em barbante, conjuntos de banheiro e agora estou fazendo uma saída de praia. E pretendo fazer muito mais, pois isso é uma forma de prevenção ao Alzheimer”.


Compartilhamento e convivência

Fatores como aprendizado e renda econômica estão na avaliação da artesã e dona de casa Maria Ana Gomes, 67, moradora do Jardim Guanabara. “Eu acho que eu estou aqui para ajudar e trocar com as pessoas. Cada dia eu aprendo mais. Qualquer oficina que eu tiver de direcionar eu consigo e eu me sinto bem, como se eu estivesse na minha própria casa. O que acrescentou para mim é que o artesanato que eu aprendi está sendo uma fonte de renda. Ele já está servindo para o grupo também.”


Se o compartilhamento está na base do Troca de Saberes, a convivência é também ressaltada pelas participantes. Como para a moradora do Jardim Felicidade, Maria das Graças da Cruz, 66, estudante, artista e doméstica. “Para mim significa muita coisa. Você convive com as colegas, com as amigas do centro cultural, principalmente as meninas aqui. A gente faz muita amizade aqui dentro. É bom principalmente para a memória. Você distrai. Nessas trocas de saberes aprendemos cada dia mais e quem sabe ainda pode ensinar. Eu estou muito contente de vir aqui todos os dias. É um prazer vir encontrar as amigas.”


Selma Maria Trindade, 74, aposentada, dona de casa e artista, moradora do Floramar, também evidencia o convívio saudável. “Eu participo desse grupo porque eu ficava muito sozinha. Eu sou viúva e fico só em casa. Na rua que eu moro não tem muitos vizinhos e eu não sou de ficar em porta. Aqui eu aprendo a fazer algumas coisas e comecei essa amizade com as meninas que são muito legais”. Selma também ressalta o valor do aprendizado. “Antes eu já sabia fazer um pouco de tudo, pois aprendi na escola a bordar e a costurar. O crochê eu não tinha paciência para fazer e não conseguia. Agora eu consigo fazer com elas. Sozinha não sei ainda, mas já consigo. Eu sempre fui uma pessoa curiosa e esse grupo está sendo ótimo. Eu vou para casa, quebro a cabeça, e venho para cá tirar dúvidas das coisas que não sei. Eu comecei com a oficina de linhas e agulhas.”


Endereço


A arte-educadora Cristiene Carvalho evidencia a relevância desse projeto para o Centro Cultural Jardim Guanabara. “O projeto Troca de Saberes é a materialização da apropriação do espaço público pela comunidade. A necessidade destas mulheres terem um lugar para produzir suas peças de artesanato e a possibilidade deste encontro se realizar em nosso equipamento vão de encontro à nossa missão de fomentar a produção artística da região. Me interessa muito como o grupo se constrói na dinâmica de autonomia, em que mulheres aprendem e ensinam artesanato, mostrando para nós a característica fundamental dessa arte, que é a sua preservação e mudança a partir da partilha de saberes.”


Essa importância é também ressaltada pela gerente Marisa Gonçalves. “É um lugar de encontro, no qual as pessoas se sentem como na extensão da própria casa. Aqui elas trocam ideias, aprendem, criam peças, riem e interagem com o centro cultural de forma verdadeira, reforçando o elemento de apropriação do espaço pelos moradores”, finaliza.


Mantido pela PBH por meio da FMC, o Centro Cultural Jardim Guanabara está localizado à Rua João Álvares Cabral, 277, bairro Jardim Guanabara. O telefone é 3277-6703/6651. E-mail: ccjg.fmc@pbh.gov.br. Funcionamento: de terça a sexta, das 9h às 17h; sábado, das 9h às 13h. ônibus: 702,707, 719, 566.
 
 

24/07/2017. Troca de Saberes. Fotos: Divulgação/FMC