6 July 2017 -
Nascida em Brumado, centro-sul da Bahia, Fabiane de Sena Silva, de 40 anos, veio para Minas Gerais aos sete anos de idade. Apaixonada pela cultura nordestina, a baiana ressente-se até de ter perdido o sotaque. Há dois anos, ela viajou para Aracaju e visitou Piranhas com a intenção de conhecer a fazenda Angicos e fazer a trilha do Cangaço, onde houve a emboscada e morte de Lampião, Maria Bonita e de parte do bando de cangaceiros. Com a viagem, surgiu a ideia de apresentar a história do personagem e trazer as características da região nordestina para os alunos da Escola Municipal Carlos Drummond de Andrade (Rua José Galding, 22, Bairro Letícia, região Venda Nova), onde é coordenadora do Programa Escola Integrada (PEI) em Belo Horizonte.
Fabiane, no entanto, precisou reformular os planos em decorrência do câncer que a afastou do trabalho durante o segundo semestre do ano passado. Mas o projeto permaneceu na cabeça e, desde maio passado, ela envolveu alunos, diretores, professores e funcionários da escola para transformar a casa onde funciona o PEI em uma retratação do Nordeste, com tudo sobre a região: geografia, fauna, flora, costumes, comidas e a riqueza de expressões artísticas.
O Projeto Lampeião propõe uma releitura da região sob o olhar do controverso e famoso cangaceiro Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, que fez história de 1917 a 1938 como uma espécie de “Rei do Cangaço” – herói para uns, vilão para outros.
Entre as ações do projeto está a instalação do ambiente nordestino, com oficinas de artesanato para confecção do figurino e do cenário; oficinas de isopografia, sobre a técnica para bordar a xilogravura; xilografias e literatura de cordel; criação de xaxado tradicional e estilizado, o ritmo preferido de Lampião. O resultado do projeto está em exposição para a comunidade escolar na Casa PEI e será objeto ainda de apresentação na festa julina da escola, no dia 8 de julho.
Montagem
Também chamado de Coco de embolada ou Coco de repente, a embolada é uma arte especialmente popular no Nordeste. Consiste em uma dupla de cantadores que, ao som do pandeiro, montam versos métricos, rápidos e improvisados, nos quais um tenta denegrir a imagem do que lhe faz dupla. Pois esse estilo foi adaptado pelo trio de alunos Arthur Lopes, Felipe Aurélio e João Marcelo, todos de 12 anos, para uma embolada sobre a vida de Lampião. Os três se apresentam acompanhados do monitor de Capoeira Rodrigo, que toca o pandeiro, em uma cantoria de aproximadamente cinco minutos.
Os garotos contam que letra foi composta em três ou quatro dias, a partir da história de Lampião contada pelo fotógrafo Benjamin Abrahão Botto, que obteve permissão do cangaceiro para entrar no acampamento e acompanhar a vida do bando, situação que gerou o filme “Baile Perfumado” e o documento histórico “Lampião – A vida e a Morte do Rei do Cangaço”.
A montagem do projeto Lampeião foi um trabalho realizado durante os meses de maio e junho por cerca de 100 alunos do Projeto Escola Integrada, com orientação de Fabiane e apoio de monitores e membros da comunidade do Programa Escola Aberta. Fabiane Sena conta que contou com a ajuda da comunidade para reunir objetos e montar o cenário, principalmente da sala temática. “A maioria dos objetos em exposição são meus e da Gecilene (monitora de intervenção artística)”, diz ela, explicando que outros, como a cabeça de boi, a canga, o alambique de madeira empoeirado, as cabaças e o ninho de Guacho, foram emprestados.
Uma das peças de destaque é a caricatura de Lampião e Maria bonita dançando xaxado, que ficará em exposição até o dia da festa julina da escola, no dia 8 de julho. “A caricatura foi feita pelo pedreiro Evanilton, que estudava no CESEC Venda Nova, onde minha irmã trabalha. Como eu envolvo todo mundo na minha ideia, falei com ela também, e esse aluno fez essa peça maravilhosa e nem quis receber nada pelo trabalho”, detalha Fabiane.
Durante a festa julina, além da apresentação da tradicional quadrilha e da embolada, haverá apresentação de uma banda de pífanos estilizada, que é outra expressão cultural típica do Nordeste. A banda é composta por alunos e monitores do PEI, além de parceiros que tocarão zabumba, triângulo, chequelê, acordeon, violão e quatro flautas doce. “Foi um caso à parte descobrir a Gabriela, de 15 anos, aluna de uma escola estadual da região que toca acordeon, porque não é um instrumento muito comum. Descobri que ela tocava no bar da família, no bairro Santa Amélia, e fui lá. Ela tem vindo para os ensaios com a mãe e tem sido muito bom”, disse.